quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Gota d´água

Eu adoro essa peça. Por mil motivos. Primeiro porque vi uma montagem maravilhosa. Depois, porque tudo que é inspirado nessas paradas gregas... são a mais pura verdade. Tava já com esse diálogo há um tempo no computador. Como sempre, Natalinda teve uma transmissão de pensamento comigo e me mandou esses dias. Haja estômago e coração pra agüentar esse Francisco. Ele fala de dor, de rejeição e de lira.

Joana diz:
Pois bem, você
Vai escutar as contas que eu vou lhe fazer
Te conheci
Moleque, frouxo, perna bamba
Barba rala, calça, bolso sem fundo.
Não sabia nada de mulher nem de samba
E tinha um puta de um medo de olhar pro mundo.
As marcas de homem, uma a uma Jasão,
Tu tirou todas de mim.
O primeiro prato,
O primeiro aplauso, a primeira inspiração.
A primeira gravata, o primeiro sapato
De duas cores, lembra?
O primeiro cigarro,
A primeira bebedeira, o primeiro filho,
O primeiro violão, o primeiro sarro,
O primeiro refrão, o primeiro estribilho
Te dei cada sinal do meu temperamento,
Te dei matéria pro teu tutano
E mesmo nessa ambição, neste momento,
Se volta contra mim, eu te dei, por engano.
Fui eu Jasão, você não se encontrou na rua
Você andava tonto quando te encontrei
Fabriquei energia que não era tua
Pra iluminar uma estrada que eu te apontei
E foi assim que eu vi nascer do nada
Uma alma ansiosa, faminta, boliçosa
Uma alma de homem.
Equanto eu, enciumada.
Dessa explosão, ao mesmo tempo, eu vaidosa,
Orgulhosa de ti Jasão, era feliz.
Eu era feliz, Jasão, feliz e iludida,
Porque não imaginava
Quando fiz dos meus dez anos uma sobrevida
Pra completar a vida que você não tinha
É que estava disperdiçando meu alento,
Estava vestindo um boneco de farinha
Assim que bateu o primeiro pé de vento,
Assim que despontou um segundo horizonte,
Lá se foi meu homem -- orgulho, minha obra
Completa, lá se foi pro acervo do Creonte.

E fala de uma intensidade que destrói qualquer soprinho de sentimento...

Jasão responde:
Você é viagem
Sem volta, Joana.
Agora eu vou te contar
Pra você, sem rancor, sem sacanagem,
Porque é que eu tinha que te abandonar.
Você tem uma ânsia, um apetite
Que me esgota.
Ninguém pode viver
Tendo que se empenhar até o limite
De suas forças: sempre pra fazer
Qualquer coisa.
É no amor, no trabalho,
É na conversa, você me exigia
Inteiro, intenso pra tudo caralho.
Tinha que olhar pro céu pra dar bom dia,
Tinha que incendiar cada abraço.
Tinha que calcular cada pequeno
Detalhe, cada gesto, cada passo,
Que um cafézinho pode ser veneno
E um copo de água, um copo de águarrás.
Só que Joana, a vida também é jogo,
É samba, é piada, é risada, é paz.
Para você não, Joana, você é fogo.
Está sempre atiçando essa fogueira,
Está sempre debruçada na quina da ribanceira
Sempre na véspera do fim do mundo
Pra você não há pausa, nada é lento,
Pra você tudo é hoje, agora ,já
Tudo é tudo, não há esquecimento
Não há descanso, nem a morte não há.
Pra você não existe dia santo.
E cada segundo parece eterno
Foi por isso que eu te amei tanto,
Porque Joana, você é um inferno.

Nossa né, gente? Que amor dolorido, vamo combiná!
:)

3 comentários:

Mariana Dall' Acqua disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Mariana Dall' Acqua disse...

MEU DEUS!!
to boba!
aiii vou ler de novo...
afff to sem fôlego
INCRÍVEL!
quero ver essa peça!
Beijos

Uma Ju disse...

"...As marcas de homem, uma a uma Jasão, tu tirou todas de mim..."

"... Porque, Joana, você é um inferno..."

Sabe, queria saber, do fundo da minha alma, do mestre Francisco, como é que ele faz isso, hein Mazi? Você me explica?

Amo-t.