domingo, 28 de fevereiro de 2010

Carta de Mãe

Queridos filhos,
Nossa casa está a venda---linda,cuidada,ajardinada e muito amada. Ela é tão maravilhosa que aceitou meu tempo de dela sair. Por mim não é somente pela escada—é pela necessidade de mudar. Morar fora do chão, abrir uma janela para um céu maior, ver outros rostos, outra feira e, principalmente, outro tipo de luz. Ficar, quem sabe, mais perto dos meus filhos,ver a Teresa crescer sem ter que atravessar a cidade e viver com menos medos.
Sei que mudanças,quase nunca são externas mas, sim, um reflexo das que se desenham internamente. O que me tranquiliza é que sei que a deixarei sem nostalgia. Acho que não é o caso do papai. As pessoas, enfim, não são iguais mas ele me entendeu.
Sinto que essa casa cumpriu seu tempo, dando a vocês, uma infância feliz, correndo na rua, e com amigos pra brincarem. E para mim e papai, momentos de extrema alegria e crescimento espiritual. Aqui engravidei aos 40 e Marilia nasceu e floresceu.
Já comecei a ver alguns aptos com terraço para por minhas plantas....e ter uma terrinha prá cheirar quando chover.
Ao longo da vida fiz poucas mudanças, mas aprendi que é importante saber a hora de mudar.
Conto com a compreensão de vocês, afinal, a casa foi e ainda é de todos nós.
Mamãe.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Silêncio afinado

"Todo silêncio é música em estado de gravidez", disse o Mia Couto, num livro lindo.
Eu nunca soube muito bem como interpretar os silêncios. E essa falta de habilidade sempre me prejudicou muito. Eu sou muito falante e as falas em excesso deixam poucos espaços vazios: os tais silêncios. No jornal, aprendi na diagramação que toda página precisa de uns buraquinhos brancos, sem linhas ou fotos, os respiros – ou silêncios. É, difícil lidar com eles, eu sempre falo para o diagramador: “mas vai ficar esse buraco aí? Não é melhor a gente colocar alguma coisa? ” É que a gente confunde silêncio com tédio. Mas não é. É a mesma sensação que dá quando acaba a luz de casa. Dá uma ansiedade, um desespero, a gente pensa: “mas e agora, o que eu vou fazer? Não posso assitir tv, ler, entrar no computador” ... é vc vai ter que ficar em silêncio, pensar, conversar com alguém. Não é fácil, precisa de tempo para entender os silêncios. O Mia Couto foi maravilhosomente esperto nesse livro que chama Antes de nascer o mundo: ele inventou um “afinador de silêncios”. Sim, é um personagem que fica perto das pesoas e “ tece os delicados fios com que se fabrica a quietude”. Não é lindo isso? Eu já tive alguns afinadores de silêncios. São aquelas pessoas que, só de estar perto, já basta. E que quando abrem a boca já estão com o silêncio tão afinado que nasce uma música. E hoje, não sei porque razão, me deu vontade de falar deles. Desses afinadores geniais que andam na contramão do tempo, do trânsito e dos problemas cotidianos. Esses pequenos vaga-lumes que – mesmo que de passagem – só deixam lembrança e o maior dos ensinamentos: o bem-estar com os espaços vazios que são, na realidade, a nossa maior liberdade.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Iemanjá


salve a rainha do mar, dia 02 de fevereiro